segunda-feira, 7 de maio de 2012



Salva por  Manoel de Barros

(Só um poeta pode curar outro)


Toda vez que encontro uma parede
ela me entrega às suas lesmas.
Não sei se isso é uma repetição de mim ou das
lesmas.
Não sei se isso é uma repetição das paredes ou
de mim.
Estarei incluído nas lesmas ou nas paredes?
Parece que lesma só é uma divulgação de mim.
Penso que dentro de minha casca
não tem um bicho:
Tem um silêncio feroz.
Estico a timidez da minha lesma até gozar na pedra.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

 
Há tempos não escrevo particularmente para alguém, assim, como uma devoradora do instante, como se o fosse perder a qualquer momento. Há tempos não faço tantas coisas... Mas, agora, com lápis, papel e o pensamento envolto, à ti escrevo, inebriada, às vezes alheia, com olhos sedentos fitados para a página antes neve.


Não penso em objetivos, escrevo apenas pelo prazer de escrever, aliás, desde pequena gosto de cartas, gosto de endereços (agora devo acrescentar a lista também os e-mails), pois descobri cedo o quanto é terno perceber que um alguém constrói frases em minha cabeça... essa percepção tive ainda pequena e me dei conta que de fato o longínquo não existia. E assim sou, sempre que necessito de algo, sinto saudades de alguém, pressinto o mistério da noite, um diálogo... me ponho a escrever, escrevo a toa, escrevo sem nada, um diário é um amigo, contrapeso de solidão.

 Mas não é o caso, agora escrevo-te como num diálogo de um ator só, no qual ele já sabe, ou não precisa de respostas, e segue sem preocupações, sem medos nem receios.

 Já é bem tarde, algumas horas atrás escutei um CD, depois fiquei pensando em você, lembrando do seu jeito  estranho.. é engraçado, e você é tão forte. Ainda agora o som flutuava pelo meu quarto, tão sutil, uma coisinha de nada, mas  eu o antevia escalando o espaço, arrojando-se sobre abismos, intrépido, audaz, tão seguro de si.

 Me vi flutuando num caleidoscópio (amarelo) de sons, sons de todos os pássaros, de mar, de flores, de chuva... quase uma caixinha de música que tive quando criança e que me levaram, não sei bem, um dia sumiu e nunca mais achei. Você me fez recordar a caixinha, me trouxe ela de volta...

 Já é bem tarde, tudo é silêncio, a cidade dos homens está dormindo, os homens também, revejo pela janela e numa fresta da cortina a rua deserta, as casas fechadas e o silêncio total. Acho que é cedo demais para fazer qualquer coisa e prometo então permanecer quieta, com meu desejo de conversar reprimido, e se escrevo também é porque sinto um desejo irreprimível de me comunicar.


Logo, logo te mandarei o escrito, como se fosse uma partitura de palavras composta noturnamente, criada sobre um piano de nuvem,  escrito numa partitura pálida e embalada pelo som de um mar distante, assim, nessa madrugada sorrateira eu escrevo apenas para dizer-lhe que estou feliz por conhecê-lo e que escutar sua voz me traz uma enorme alegria.

Dorme sossegado, temos todo tempo do mundo... a noite ainda é uma criança,


Bom dia, meu sei lá o quê!!!!

quinta-feira, 3 de maio de 2012



Transparência...
 Estamos acessos
Dentro do jogo de espelhos
Que brinca com nossas imagens
Envolvendo, clareando, desenhando
Refletindo...

Que bons ventos o trazem
Guiado por uns dedos,
ou seriam uns versos,
opacos e transparentes?
Yemanjá,
Que mares deseja que eu naufrague,
E que contas me trouxe para enfeitar a pele?
Eu até que nadaria, se não tivesse tanto medo...

Mas me sobra uma coragem de gigante
Que me faz certa de flutuar,
E ainda que eu desça ao fundo
Não existe morte.
Porque a dona das águas
Que mora no verde dos olhos,
Me pede que eu tenha a coragem,
E que mergulhe, perdida
Porque lá adiante, ela me salva,
Embalada pelas ondas, vestida de algas
Refeita do amor de mãe
E me fazendo estrela das transparências,
Menina dos Olhos d’água.

quarta-feira, 2 de maio de 2012


Depois da Madrugada...

Já era bem tarde
E chovia atrás dos verdes que de tão escuros já não eram mais verdes
Eram cinzas...

E foi que de repente,
Ouvi um barulho de passos devagar, um rumor de cascatas que me atraiu a atenção.
Mas o tempo ainda permanecia imóvel,
Porque se fazia escuridão dentro de um peito perdido, que mais parecia um cemitério onde os fantasmas eram os atores principais.

Mas era tanta tristeza nos olhos da menina,
Que até perdi a conta dos choros que foram abafados com cobertores de lã,
E dos gritos emitidos numa tarde de tenebrosa dor.

Mas o tempo hoje se esvai numa calmaria só,
Tudo ficou um pouco velho... velhos...
Porque a vida passa no burburinho da noite
E nesse tempo infinito o sol vai se forrando de amarelo,
Cobrindo os antigos verdes-cinzas
E o coração despedaçado
Constitui-se novamente num vermelhão vívido
Revivido numa nova paixão.



Entrelinhas

Queria me vestir de brisa,
Vagar no tempo
Revelar mistérios
Decifrar-me,
Não ser tão frágil (nem fingir não ser)

Invoco você, e seu corpo,
Meu menino,
Porque durante muito tempo procurei minhas pétalas,
Minhas rosas, e meu jardim de ilusões.
Escondendo sentimentos,
Me esquivando detrás dos caules firmes,
Eu não era firme, só os caules no qual me apoiava.

E hoje, você passeia nos meus sonhos,
Brinca com minhas flores,
Amarelas.
Vaga solitário
E embriagado em música nas noites sem ensaio,
De improviso, o amor nascendo e crescendo tão depressa que mal cabe dentro do quarto,  de gemidos abafados...

Talvez parta depressa,
E esqueça meu rosto, e eu o seu cheiro
Mas, se existe música, fica,
Sua solidão é minha solidão também,
Guiando meus dedos tortos,
Levando-me aos labirintos.

Sei a dor da ausência,
Da marca deixada no peito esquerdo,
Fundido em brasa, queimando,
Sei o poder do som perpetuado na memória,
E do silêncio em forma de pausa,
Que canta nas entrelinhas,
Um beijo sentido,
Que falta.
 
Também sinto meu peito tremer quanto te avisto de minha janela, Quando olho seu jeito de menino, que mesmo com cem anos ainda o terá, porque ser menino é uma qualidade dos seres sensíveis, amáveis e sinceros. Procuro não pensar no pára-quedas, tenho medo que ele falhe e o naufrágio seja inevitável... Por isso não pensarei mais nele. Pensarei num bosque com margaridas na janela, e um mar refletindo nosso amor suavizado pela brisa, sem equívocos, sem o maldito “sentir-se só”. Sinto-me um jardim de flores semeadas, regadas quando possuídas por seu corpo: seu hálito meu ar seu corpo minha casa sua saliva meu orvalho sua voz minha canção de ninar (que me acalma) suas mãos. Ah suas mãos meu escudo – me protegendo do mundo – segurando-as me sinto protegida. Um pássaro guardado. Sou tua, ainda que não seja tão fácil demonstrar, ainda que sofra com isso, mesmo que o destino o faça diferente. Conheço seus medos e convivo diariamente com os meus. Não é fácil. Mas te amo como uma ursa faminta que acabou de acordar depois de seis (ou mais) meses hibernando, por isto estou tão fraca. Perdão, sou um ursa cabeça dura. Não é por mal, se me calo é só por medo, se falo também é medo. Mas tenho aprendido com você muitas coisas, as vezes temos mesmo que gritar para acordar o outro, porque o tempo de hibernar já acabou. É tempo de amar... Queria te escrever mais, agora falta o tempo. Mais saiba: Meu corpo precisa do teu, sempre. Meu menino, meu sócio, meu dono, meu amante, minha vida. Também chorei, e com a cabeça enfiada no travesseiro repeti seu nome dentro da madrugada até adormecer.
As vezes pensamos, e não falamos. As vezes falamos e nada dizemos, enrolamos, escondemos. E lá no nosso íntimo fica a sensação de tristeza, de incertezas. Talvez pelo que se deixou de fazer (ou dizer). Debruço-me sobre as janelas, navego em meus pensamentos, pergunto as nuvens de onde vens, se vens... E não encontro resposta, o tempo voa, só ouço ecos lá fora. Um eco febril, contaminado pelo tempo dos homens, que corre circular como o relógio, e que nem o pulso pulsando consegue reverter ou modificá-lo. Me recordo vagamente de um acorde, ou seria um trecho de poema, seu? Inútil procurar o que poderia ter sido eterno, inútil. Por isso vago no meu tempo, estranho, e meu . Talvez quem sabe escreva uma história que contenha fragmentos desses nossos momentos, de suas histórias tristes e da minha melancolia escondida atrás do sorriso, ou das canções que canto. Assim, lembraremos que o tempo passou, correu como um louco procurando desvendar esses enlaces de vidas, essas quimeras, esse mistério que é o amor ou a morte. Essa mulher de braços cruzados, adulta, escondendo os dedos, as mãos... Os sentimentos e roendo as unhas...